quarta-feira, 17 de setembro de 2008

RESENHA: Livro "Em Águas Profundas" de David Lynch


Por Nilton Rodrigues



David Lynch é um cara bacana. É o típico exemplo de força de vontade e ineditismo dentro do marasmo da indústria cinematográfica norte-americana. Não satisfeito em ser pintor, cineasta, cambista no Maracanã nas horas vagas, agora o topetudo desencana como escritor.
“Em Águas Profundas” (Ed. Gryphus, 193 pgs.), o insano cineasta segura o leitor pela mão e percorre um gostoso caminho pelos benefícios da Meditação Transcendental, cuja técnica o cara é adepto há mais de 30 anos.
No livro, Lynch patina em inúmeros (pequeninos) capítulos ao discursar sobre a tal meditação, reforçando seus benefícios em todas as áreas da vida. Porém, no frigir dos ovos, o assunto é tratado de uma forma ampassan e inconsistente, soando muito mais como um discurso religioso (embora não seja uma religião).
Lynch segue a risca, muitas vezes pressionado pela organicidade do texto, uma sabatinagem incômoda. Talvez o objetivo seja realmente este, “não dê o peixe, mas ensine a pescar”, fazendo com que o leitor busque mais referências e desperte o interesse pela meditação, mas a ausência de um aprofundamento maior nas técnicas suja um pouco a veracidade da obra e acaba caindo na perigosa vala comum daquilo que permeia a maioria das publicações dos famigerados “livros de bem-estar”: charlatanismo.
Mas quando Lynch decide falar sobre cinema é que a chapa começa a esquentar. “Em Águas Profundas” assuntos como criatividade, intuição, inspiração, e curiosidades sobre a realização de seus filmes desfilam por parágrafos de uma maneira deliciosa. É como conversa de fim de noite com seu melhor amigo.
É impossível não se encantar com momentos memoráveis, como o capítulo chamado “A Caixa e a Chave”, onde Lynch joga um balde de água fria nos ditos desbravadores e entendedores de seu peculiar prisma, e revela que os misteriosos objetos que aparecem em “Cidade dos Sonhos” ele diz não ter a menor idéia do que possam ser. Ou quando o autor descreve o encontro com seu ídolo Fellini à beira da morte, e também revela seus ídolos, como o mestre Stanley Kubrick. Saber que a simplicidade de uma chama ou a casca de uma árvore servem de inspiração para o cineasta, faz o fã conhecer um pouco mais da mente e dos devaneios do diretor.
“Em Águas Profundas” é indicado para fãs e nada mais. O livro abre possibilidades interessantes para quem, sobretudo, trabalha com a criatividade em seu dia-a-dia e pode funcionar como um estopim para uma nova forma de encarar a vida, se assim escolher. Mas é quando o assunto é cinema que Lynch, sem sombra de dúvida, mostra que é o guru.
NOTA: 7

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